O destino e suas ironias. A Petrobrás anunciou agora há pouco que vai rebatizar o Polo Gaslub (o antigo Comperj), que agora passará a ser chamado de Complexo de Energias Boaventura e será inaugurado na próxima sexta-feira (13), em Itaboraí (RJ). O presidente Lula participará do evento. O novo nome é uma referência ao Convento São Boaventura, localizado dentro da unidade e considerado uma das primeiras construções da região conhecida hoje como o município de Itaboraí. Inclusive, as ruínas do convento foram conservadas pela companhia. A mudança de nome para algo que remete à espiritualidade é simbólica em um projeto que viveu um pandemônio de problemas ao longo de sua construção. Para além disso, a Petrobrás, por coincidência ou não, escolheu justamente uma sexta-feira 13 para inaugurar o projeto para, quem sabe, exorcizar de vez todos os fantasmas que assombraram as obras em quase duas décadas.
A Petrobras obteve, no último dia 9, a aprovação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e iniciou os procedimentos para operação da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN). Estão sendo realizadas as etapas finais de preparo da unidade, com a calibração de processos e equipamentos. Nessa fase, o gás ainda não é disponibilizado para o mercado. O início das operações comerciais está previsto para a primeira quinzena de outubro. O Complexo conta com mais de 600 profissionais, entre próprios e terceirizados, envolvidos diretamente na operação, manutenção de equipamentos e suporte operacional do gasoduto e das plantas de processamento de gás e de utilidades.
A cerimônia marcará simbolicamente a inauguração da UPGN e do gasoduto Rota 3. Esse será um acontecimento marcante para o setor de óleo e gás brasileira, dada a importância operacional do empreendimento, que trará mais gás natural à costa em um momento em que o país discute como aumentar a oferta do insumo no mercado interno. Porém, a história do Complexo de Energias Boaventura envolve outras dimensões, como seu histórico de polêmicas, idas e vindas nas obras, questões políticas e até casos de corrupção.
Tudo começou em 2006, quando o projeto foi oficialmente lançado durante o primeiro mandato do governo Lula. Sob o nome de Comperj – Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, a ideia inicial era que o projeto pudesse processar 150 mil barris diários de petróleo pesado do campo de Marlim, com o objetivo de criar um grande polo petroquímico em Itaboraí e região. As obras começaram efetivamente em 2008, com a previsão inicial de que o complexo entraria em operação em 2012. O emtão Comperj incluiria duas refinarias, uma planta de processamento de gás natural e uma planta petroquímica de última geração.
Já em 2012, surgiam sinais de que o projeto ambicioso poderia não sair como planejado. Naquele ano, a Petrobras reduziu o escopo do complexo para uma refinaria de derivados de petróleo, prevista para 2015. A obra gerou grande empolgação e expectativa de geração de empregos e renda na região. Contudo, o cenário começou a desmoronar em 2015, quando o país mergulhou na crise desencadeada pela Operação Lava Jato. O Comperj foi diretamente afetado pelas investigações conduzidas à época pelo juiz Sérgio Moro e teve suas obras suspensas.
Após algumas alterações no conceito ao longo dos últimos anos, hoje o Complexo de Energias Boaventura se resume a uma Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) e o gasoduto Rota 3. No entanto, a Petrobrás lançou em maio uma licitação pública para contratação das empresas que vão realizar as obras de construção e de conclusão de unidades operacionais no polo. O conjunto de unidades terá capacidade aproximada de produzir 12 mil barris por dia (bpd) de óleos lubrificantes de Grupo II, além de 75 mil bpd de diesel S-10 e 20 mil bpd de querosene de aviação (QAV-1), de baixíssimo teor de enxofre. A Petrobrás planeja ainda instalar uma nova usina térmica no Gaslub, com capacidade para gerar 400 MW.
As obras da UPGN também foram muito tumultuadas. A construção do projeto estava sendo tocada pelo consórcio formado pela chinesa Kerui e a brasileira Método. Contudo, em julho de 2022, a Petrobrás decidiu encerrar o contrato. Antes desse cancelamento, o consórcio já havia demitido 2 mil pessoas que trabalhavam nas obras. O imbróglio na UPGN do Complexo de Energias Boaventura estava relacionado com desentendimento entre as empresas sobre os valores das obras. Inicialmente orçada em cerca de R$ 2 bilhões pelos chineses, a UPGN viu seu valor saltar para mais de R$ 3 bilhões, por conta de variações cambiais, impactos da pandemia de covid-19 e mudanças no projeto. Em 2023, a Petrobrás anunciou a contratação da Toyo Setal para finalizar a construção.
A UPGN do Complexo de Energias Boaventura possuirá dois trens, cada um com capacidade de 10,5 milhões de metros cúbicos por dia. O empreendimento terá capacidade para processar 21 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural provenientes do polo pré-sal da Bacia de Santos. Quando estiver em operação, a vazão de escoamento do gasoduto Rota 3 será de aproximadamente 18 milhões de m³ de gás por dia. Juntos, o Rota 3 e as Rotas 1 (UPGN Caraguatatuba/SP) e 2 (Terminal Cabiúnas/RJ) – as duas últimas já em operação — terão capacidade total para escoar 44 milhões de metros cúbicos de gás por dia.
Fonte: PetroNotícias